Frankenstein, petecas caídas e um pouco de anestesia
Edição #291: Sobre parar e voltar a escrever
Fui engolida nas últimas semanas pelo trabalho e mestrado. No entanto, seria uma mentira dizer que não sobrou tempo para mais nada: é só abrir o celular para descobrir que gastei quase quatro horas em joguinhos. Tem um de somar os números que virou um novo vício. Outras três foram para o Instagram - e nem de longe a parte profissional foi responsável tudo isso. Eu gosto mesmo é de assistir reels de receitas e de gente fazendo besteira. Tenho plena consciência que estas horas seriam mais do suficiente para escrever algumas edições da newsletter. Mas precisei deixar a peteca cair na semana passada.
Não escrevo isso em um tom de autopenitência, mas sim como uma observação. Eu não quis escrever na semana passada. Viajei a trabalho para Las Vegas, vivi uma mudança grande de fuso, passei os dias entre uma feira e reuniões e as noites entre jantares e coqueteis de trabalho. No tempinho livre, eu queria adiantar as leituras do mestrado e anestesiar meu cérebro um pouco. Eu preciso disso.
Estou fazendo um trabalho incrível para esta disciplina no mestrado: uma comparação entre o filme Pobres criaturas e o livro Frankenstein. Argumentei comigo mesma que eu precisava também ler o livro que deu origem ao filme - e Poor Things, de Alasdair Gray, foi a leitura escolhida para essa semana de trabalho e bagunça em Las Vegas. Ainda preciso escrever aqui como foi incrível conhecer uma nova versão da minha querida Bella Baxter.
Não tive espaço mental algum para escrever uma edição aqui. E eu, que me orgulho tanto de não pular uma única edição, me permiti me dar uma semana de férias da newsletter. Foi ótimo, necessário e tudo aquilo que a gente diz a si mesmo quando precisa se justificar de algo. Mas aconteceu exatamente o que eu sabia que iria acontecer: eu travei.
Continuei tendo todas as desculpas do mundo nesta semana: muito trabalho, novas responsabilidades, um artigo atrasado no mestrado, mil saudades para matar das minhas duas meninas. E fui encontrando cada vez mais desculpas para pular mais uma edição aqui.
Minha experiência me ensinou que é muito mais fácil escrever toda semana do que a cada duas. Existe um ritmo, uma energia, um olhar atento ao mundo que é a alquimia necessária para cada edição que publico aqui. Entendi que a única forma de destravar é começar a escrever a primeira coisa que aparece na minha cabeça. Que a única forma de encontrar tempo é cavar em meio às fendas da rotina.
Esta edição nasceu espremida entre a mamografia de rotina e a ida para o escritório, enquanto tinjo o cabelo. Na correria antes de o dia começar pra valer e a enxurrada de emails e mensagens de WhatsApp tomarem o lugar de quaisquer outras preocupações. Como um pequeno protesto de autonomia: não vou começar a fazer relatório algum antes de escrever. Ela chega atrasada na sua caixa de entrada, mas nasce com orgulho. Um pequeno ato de resistência e de força ao quebrar a inércia. Uma afirmação: escrevo porque gosto de escrever.
PS: As respostas aos comentários estão todas travadas também. Mas logo retomo, tá?
Quando a gente está no movimento é mais fácil. O problema está na pausa, né? Voltar fica mais difícil. Estou nessa exata situação. Mas estou entrando naquele ritmo “frenético” que nos leva a fazer várias coisas. Ele é ruim, quando em excesso, mas pode gerar bons resultados, desde que usado com cautela.
Carol, vivem falando por aí que os escritores vivem falando de escrever e principalmente, da dificuldade em fazê-lo, mas é fato (pelo menos pra mim!) que gosto de ler sobre isso. Traz um aconchego saber que não estamos sozinhos nessa. Feliz pelo seu ato de resistência que nos devolveu a chance de te ler:) um beijo grande!