A nostalgia das mães não é a nostalgia da sua infância, mas da infância dos seus filhos. Quando penso que está passando, passando rápido demais, sinto uma dor que começa na aorta e se espalha por todo o corpo. É o sofrimento de quem entende de que estes anos são doces demais.
Com a Bia, minha filha mais velha, eu era mais jovem e queria apenas curtir cada momento presente com ela. O dia em que ela me deu o primeiro sorriso, a primeira gargalhada, os primeiros passinhos. Todos estão impressos dentro de mim. As brincadeiras com saia de tutu, os mergulhos no mar. Eu tinha um caderninho onde anotava todas as primeiras palavras: as vezes em que ela chamava papagaio de pacapacabaio, o samonete, o ômbdiu.
Mark Twain resume essa dor como só quem a viveu sabe: "O querido erro de pronúncia incorreta da infância! Meu Deus, não há música que se compare a ele; e como se entristece quando ele se dissipa e se dissolve na correção, sabendo que nunca mais visitará o ouvido enlutado novamente."
Mas me deleitava sem aflição, sabendo que logo ela iria ganhar um irmãozinho ou irmãzinha e eu poderia viver tudo aquilo de novo. Tirava bilhões de fotos, registrava as fofurices com a paz de quem tem uma carta coringa na manga: na hora em que batessem as saudades, eu poderia começar o jogo de novo.
Não sabia, no entanto, que a Isadora, minha caçula, iria levar tantos anos para chegar. Tempo o suficiente para eu passar da certeza de engravidar logo para a esperança, para a ansiedade e, por fim, o desespero. Tempo tão longo para me convencer de que ela não viria e desistir do sonho, viver um luto da filha que eu tanto desejava e que não era para ser. Tanto tempo que criei coragem de tentar de novo, na confiança maluca de que daquela vez seria diferente - e foi. Daquela vez foi, e engravidei em um piscar de olhos que levou, na realidade, seis anos para acontecer.
Com a Izzy, foi diferente desde o início. Eu sabia que eu não teria mais filhos e que desta vez não haveria repeteco. E a cada fase dela que passa, cada gesto delicioso que ela faz e depois deixa de fazer racha meu coração um pouquinho.
Nesta semana, ela aprendeu a falar Bia e não chama mais a irmã mais velha de Tía. Ela já anda há meses, mas engatinhou outro dia pela casa só para nos lembrar que ela já não faz mais aquilo. Não quero esquecer o olhar de sono quando acorda, o jeito que faz carinho nas pelúcias, os beijos e agarros que me dá, como pede com gestos cada música que ela ama ouvir. Dedinho na palma da mão é galinha pintadinha, a mãozinha fechada lá no alto é a canção do pingo que ela ouve lá na natação. Ah, as aulas de natação, a alegria e o medinho que ela sente quando se prende em mim como um bicho preguiça. A forma como anda para trás com passos bem miudinhos para se sentar no seu banquinho - e depois, bate palmas e grita êêêê para si mesma.
Estou terminando de ler o magnífico A vida secreta das emoções, de Ilaria Gaspari, e me pego no capítulo sobre nostalgia:
"A nostalgia é sempre o pensamento doloroso de um lugar do qual a pessoa está longe, ao qual ela pertence e do qual se sente desenraizada (...). Para o nostálgico, o problema é justamente o retorno: impossível e, no entanto, desejado com toda a ambivalência que se insínua na esfera do desejo".
O passado do qual sinto nostalgia não está tão longe assim. Às vezes, ele passou faz dois minutos. Mas me agarro nele com todas as forças. O desejo de retorno é impossível e, também, ambivalente: um lado meu só pensa em como vai ser quando as duas estiverem na escola e a casa for minha pelas manhãs, quando as duas estiverem grandes, quando ninguém me acordar mais tão cedo no fim de semana.
Mas nostalgia não é bem isso, me diz Gaspari. "É aquilo que projetamos sobre o passado, não o passado em si, que permite a ilusão de ótica que chamamos nostalgia". A nostalgia é também a projeção que criamos, aparando todas as arestas difíceis e deixando só a beleza envernizada. Não penso nessas horas em todos os ataques de birra, nas brigas, nas madrugadas insones.
Olho para a Bia e ela é a prova ambulante de que passa rápido demais. Já não quer mais que eu dê banho nela, logo já não vai pedir para que eu a coloque para dormir. Escolhe as roupas sozinha, arruma a cama, é capaz de passar a tarde toda jogando com os amigos via FaceTime sem querer a minha presença. Virou uma moça. Os anos de bebê estão longe; ainda assim, me apego a cada coisinha doce que fazemos juntas: os passeios de mãos dadas, as rodadas de Uno e War, quando ela deita no meu colo para assistir a um filme. Ela ainda é criança, a infância é cheia de deslumbramento com a vida e graça nos lugares mais improváveis.
Não se engane - este é um sentimento agridoce que eu prefiro carregar nos tons açucarados. O medo de não estar aproveitando direito, não o suficiente, é um bom indício de que estou tão presente, de olho em todas as miudezas que compõem a maternidade. Retomo a Ilaria Gaspari quando ela fala da cura para a nostalgia:
"A única cura possível para a nostalgia na verdade não a cura, mas se aninha no sofrimento sutil que destila, e que nos conta tanto de nós, do que poderíamos ser e não somos mais, daquilo que fomos quando não conseguíamos nos enxergar nem compreender".
Decido então me aninhar na sensação, perceber o quanto ela revela de mim e tentar, ainda que por um instante, ser e me enxergar sendo mãe dessas duas meninas no agora. Como a meditação mais deliciosa do mundo.
Não sou mãe, mas fiquei emocionada com o seu texto! Posso dar um pouco de esperança em falar que, mesmo que não aconteça as mesmas coisas da infância, você ainda vai ter muitas primeiras vezes com as suas filhas. O primeiro(a) namorado(a), o primeiro dia de aula na faculdade, o primeiro emprego, o primeiro coração partido, a primeira vez dirigindo, o primeiro neto… A infância realmente é ótima, mas você tem uma vida inteira com elas!
"O passado do qual sinto nostalgia não está tão longe assim. Às vezes, ele passou faz dois minutos". Ai, bateu fortíssimo aqui <3 Que texto lindo!