Os bons amigos da literatura
Dossiê literário #4: 8 livros com as melhores amizades da literatura
Foi com Aristóteles que percebi quantas das minhas amizades não são, de fato, amizades. Vou explicar melhor. Ele classifica as amizades em três categorias: a utilitária, a dos prazeres e a das virtudes.
A utilitária é a amizade por interesse, baseada no que esperamos conseguir do outro. Sabe aquilo de querer se aproximar de uma pessoa só porque ela trabalha na empresa X ou conhece é dona de uma agência? Pois é - amizade de LinkedIn.
Quando li isso, lembrei de uma amiga da época da faculdade que reclamava: "Em São Paulo, o monotema é trabalho. Você conhece uma pessoa e ela logo pergunta: o que você faz? No Rio, o monotema é a praia: qual você frequenta?". A verdade é que esta cidade onde vivo é utilitária e tantas das nossas amizades são, na verdade, um coleguismo travestido pelo capitalismo para a vida e a carreira andarem para frente. Faz parte do jogo.
Depois vem a amizade dos prazeres, travada com as pessoas com quem desejamos dividir as coisas boas da vida. Amigo para ir em festa, viagem, cinema, barzinho - tudo de preferência bem instagramável. Nada contra, também adoro. Mas na hora que li, lembrei de uma amiga com quem sabia que podia contar para todas as festas bacanas nos fins de semana na época de solteira. Nós éramos grudadas, mas ela não foi no meu casamento. Disse que tinha acabado de voltar de uma viagem e estava com preguiça.
Por fim, Aristóteles fala das amizades das virtudes. É a forma mais elevada, aquela em que duas pessoas se aproximam por dividirem os mesmos valores, crenças e objetivos. Esse tipo de amizade não é baseado em nenhuma recompensa exterior, mas sim na felicidade que um encontra na presença do outro.
“A amizade perfeita é aquela entre os indivíduos bons e mutuamente semelhantes em matéria de virtude, isso porque desejam mutuamente o bem mútuo na qualidade de bem e são bons em si mesmos”, diz o filósofo.
É como o freudenfreude, a expressão alemã que se refere à alegria que sentimos quando nossos amigos vivem um sucesso. Este tipo de sentimento só pode habitar uma dessas amizades mágicas de virtudes do Aristóteles. É uma felicidade enorme, aquela de gostar tanto de uma pessoa a ponto de vibrar com as vitórias dela como se fossem nossas.
Eu tenho a sorte de ter boas amigas de virtudes, mas não dá para imaginar que todos os meus relacionamentos conseguem acessar este nível. Não é realista. Também é importante lembrar que Aristóteles é o filósofo dos ideais, das noções perfeitas. Pouca coisa na vida se comporta do jeito que deveria ser.
Mas fui buscar na literatura como as amizades são retratadas e com quais objetivos. Entendi que os amigos aparecem na literatura como uma forma de explorar temas como confiança e compreensão, mas também para mostrar como nossas relações podem ser complexas. Pense em Lila e Lenu da Tetralogia Napolitana, de Elena Ferrante. Inveja e admiração, maus entendidos e compreensão, ciúmes e desejo de ajudar… a base do relacionamento entre as duas personagens é ambígua e cheia de nuances - tão parecida com a vida real.
A amizade na literatura também é importante para mostrar o crescimento pessoal e desenvolvimento dos personagens, e a definição de seus valores éticos e morais. No fundo, amigos são como espelhos para o protagonista trabalhar seu senso de identidade, seja de uma forma idealizada ou mais complexa com nuances.
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