Os cem melhores livros do século
Edição #276: A lista do NYT funciona como uma força gravitacional para quem ama ler
Eu odeio listas. Mas também sou extremamente suscetível a elas, especialmente se ninguém na minha timeline falar sobre outra coisa. É uma força gravitacional: como não sentir curiosidade com uma lista como a do New York Times que promete revelar os 100 melhores livros do século?
Na primeira vez que vejo um post sobre a lista, pulo sem dó. Tudo que não quero é ver quantos livros não li, arrumar uma centena de novos desejos, encher o carrinho da Amazon (me julgue). Tenho já uma lista de leituras enorme. Entre o mestrado, minha pesquisa, o podcast e tudo aquilo que leio por puro prazer, já não cabe mais nada.
Depois uma amiga me marca na publicação. Falo com ela da ansiedade que essas listas me trazem. Ela retruca: é puro FOMO. E como não poderia ser? Se o New York Times falou, está falado. Os livros devem ser espetaculares.
É aí que nasce o comichão: será mesmo? Será que o jornal lembrou de todo mundo? Ou esqueceu uma região geográfica, um gênero literário, um autor muito amado?
Resolvo dar uma espiadinha. Vejo que além da lista principal, eles publicaram dezenas de listas com os votos dos autores consultados para o ranking. Socorro. Temos ali potencialmente uma lista de leituras que, se seguida à risca, levaria anos e anos para ser concluída (sem ler nada além daquilo). E para quê? Para dizer que li todos os melhores do século do New York Times? E todos os livros que ainda estão para ser publicados? E aqueles que não entraram na lista e ainda assim mudariam minha vida para sempre?
Como você vê, eu levo a sério a coisa toda. Decido não ver a lista. Eu não preciso de mais uma fonte de ansiedade nestes tempos tão intensos. Fecho o Instagram e a aba do navegador, volto a trabalhar, abro um livro. Qualquer coisa vale pra fugir do que já virou uma enorme tentação.
O golpe de misericórdia vem quando vejo outra amiga postando quantos livros da lista ela leu. Aí já é demais. Como uma nova emoção do Divertida Mente, entra o instinto competitivo. Será que eu li mais que ela? Quantos será que eu li? A perspectiva de saber como o meu gosto e ritmo de leitura batem com a tal lista é deliciosa demais para ignorar.
Abro a lista. Nunca ouvi falar do número 100, mas o 99 é um que eu queria ler faz tempos. Quando chego no 94, bingo - eu amei Sobre a beleza, da Zadie Smith. Essa é a sensação gostosa de ver uma lista dessas: ela reflete o nosso bom gosto de volta para nós mesmos, um espelho e um selo de aprovação. Aquele livro que você amou é bom mesmo. Vaidade literária pura.
Continuo e percebo que dá para marcar aqueles que eu quero ler. Vou com parcimônia, clicando em todos os que li e apenas naqueles que eu realmente gostaria de ler. Conforme a lista avança, bate a curiosidade. Será que eu li os dez melhores de todos? Será que li o melhor?
Agora já estou completamente entregue ao exercício. Estou tão empolgada que vou perdendo o espírito crítico. Só perto do 30º que me lembro. Onde estão os autores latinos para além do Bolaño (que preciso ler com urgência)? Cadê o Murakami? E o Amos Oz? No meu ranking, precisava estar a Camila Sosa Villada e a Carmen Maria Machado. Por que Torto Arado ou Marrom e Amarelo não estão lá? (Tantos brasileiros maravilhosos, mas só me lembro dos traduzidos para o inglês). Ou o Zambra? Ou mesmo o Paul Auster?
Chego finalmente ao número 1 e adoro a escolha: A amiga genial, da Elena Ferrante. Poucos livros tiveram um impacto tão grande quanto essa porta de entrada para o universo da Ferrante. Descubro com orgulho que li vinte livros da lista. Não é pouca coisa. Ganho uma imagem para postar no Instagram e a lista de todos aqueles que quero ler.
Mas fica um gosto estranho na boca. Aquele que me lembra que não gosto de ler para ticar uma lista ou para contar no fim do ano quantos livros li. Lembro que toda lista é feita com um recorte e que sempre fica gente de fora. E mais: o meu gosto não precisa ser igual ao da lista. Nenhum dos livros que mais amei nos últimos tempos entrou nela (alô, The Lost, do Daniel Mendelsohn).
Olho para todos os livros que fiquei com vontade de ler e entendo que vou querer entrelaçar aquela nova lista com a minha particular. Alguns já estavam lá, outros não. Mas não resisto ao impulso e encomendo Wolf Hall na hora mesmo. Ele deve pular na frente de todos os outros - bateu aquela vontade de começar a lê-lo imediatamente que só quem ama os livros sabe como é.
E se você ficou curioso, aí vão as minhas duas listas:
I’ve read 20 books on the list ...
My Brilliant Friend ● Never Let Me Go ● The Year of Magical Thinking ● Outline ●Pachinko ● Atonement ● Americanah ● Fun Home ● The Years ● A Visit From the Goon Squad ● The Goldfinch ● Persepolis ● The Plot Against America ● Far From the Tree ● Tomorrow, and Tomorrow, and Tomorrow ● The Story of the Lost Child ● When We Cease to Understand the World ● The Human Stain ● Station Eleven ● On Beauty
... and I want to read 14.
Wolf Hall ● 2666 ● Austerlitz ● The Brief Wondrous Life of Oscar Wao ● The Road ●Lincoln in the Bardo ● The Overstory ● The Savage Detectives ● Life After Life ● The Copenhagen Trilogy ● Exit West ● Hurricane Season ● Bel Canto ● How to Be Both
Seu post é mais legal que a lista do NYT 😆 mas cria o mesmo FOMO! Essa coisa do livro que chega e fura e a fila é maravilhosa e inexplicável. A lista dos “quero ler” se expande como um organismo vivíssimo, se movimentando sem parar, se deixando influenciar por tudo que acontece em volta. Tenho Wolf Hall baixado há anos — dica da Liz Gilbert de anos atrás. Agora ele tá aqui no meu nariz pedindo atenção. Socorro! E obrigada pelo post 👉🏼❤️🐚
li cerca de 20 também e tem alguns outros (não muitos) que despertaram vontade de incluir na minha lista pessoal. senti falta de MUITA coisa que eu, pessoalmente, considero os "mais mais" do século, mas a existência da lista foi o suficiente pra eu colocar meu próprio paladar literário em dúvida 😂 um saco isso, né? ao mesmo tempo, acho uma delícia expandir a lista de livros eternamente, essa sensação meio desesperadora mas meio delícia de saber que nunca faltarão bons livros para ler. olhando as suas escolhas, já incluí mais alguns por aqui! amei o texto 🖤 beijo, querida