Minha primeira amizade foi imaginária. Muita gente tem um amigo imaginário, mas eu tinha sete – os sete anões, no caso, e eu era a Branca de Neve. No início, era algo leve. Minha mãe conta que eu não respondia mais por Carol, apenas por Branca de Neve. Se era hora do banho ou do jantar, não adiantava nada me convocar pelo nome que ela escolheu. Mas bastava chamar “Branca de Neve!”, e lá ia eu, toda saltitante.
No entanto, o negócio piorou aos poucos. Ninguém podia se sentar comigo no sofá, afinal estava rodeada dos anões – e ai de alguém que esmagasse o Zangado. Na saída da escola, minha mãe precisava ficar com a porta do carro aberta por longos minutos até que todos se acomodassem. Se ela saísse antes da hora, o berreiro era certo – havia esquecido o Dunga.
Precisaram fazer uma leve intervenção (leia-se: parar de me contar tantas histórias) para eu me convencer aos poucos de que não era a Branca de Neve. A partir daí, minhas próximas amizades foram mais concretas.
Teve a amiga dos salões de festa e parquinhos e a trocas de papel de carta. A turma do prédio, com quem amava jogar queimada. Aquelas que eram super descoladas e ainda assim aceitaram meu convite para virem dormir em casa e viramos unha e carne. A minha prima, que é a irmã que nunca tive (e entende como ninguém as minhas angústias de família). A minha mãe, que é sempre a primeira pessoa pra quem ligo.
Quando mudei de escola, no colegial, o mais difícil foi me encontrar novamente nas minhas amizades. Início da adolescência, meus pais estavam se separando e eu já não sabia mais direito quem eu era ou do que eu gostava. Surgiram então novas amigas da classe, amizades que nasceram por morarmos no mesmo bairro, gostarmos do mesmo livro ou para nos ajudarmos a estudar para uma prova de biologia.
Um dia, a irmã do amigo do meu namorado se sentou pra conversar comigo depois de uma prova de história. Nunca mais nos desgrudamos. Viramos amigas de cursinho, amigas de viagem, amigas de faculdade, amigas de balada – amigas da vida. Quando eu achava que estávamos em momentos de vida totalmente diferentes, engravidamos juntas. Agora, ela é minha amiga das madrugadas insones também. Daqui a pouco seremos amigas da pracinha.
Teve a amiga que me apresentaram porque ela estava indo morar em Paris e eu já estava lá havia alguns meses. Amizade de sorvetes e crepes de Nutella e de fazer a lavanderia juntas, no meu apartamento, tomando vinho – vinho, inclusive, que ela derrubou no meu notebook. Fomos juntas até a estação final da linha roxa do metrô para ouvirmos o diagnóstico fatal: “il est mort”. O computador estava morto, mas a amizade, jamais. Hoje ela é minha amiga de textos, do bairro e das angústias e alegrias com os pais e os filhos – e uma hora ela vai aceitar meu convite de irmos juntas na feira aqui do lado de casa.
Teve a amiga com quem saí pela primeira vez por iniciativa dos nossos maridos. Eu não sabia muito se ia gostar dela e estava com um pouco de preguiça daquele jantar. Mas foi amor à primeira vista e conheci ali a pessoa mais forte e iluminada que já vi. Daquelas que você sente que se ela deu conta de tudo aquilo, você também dá. Amiga de risadas nos áudios de WhatsApp, pizzadas em família e os poucos drinks permitidos até a pandemia chegar. Estou esperando os próximos.
São tantas. Aquela amiga da faculdade que vira uma paixão e vira amiga para toda a vida. Às vezes passamos anos sem nos falar, mas quando chega uma mensagem no WhatsApp, aquilo vira uma troca infindável de podcasts. A conhecida de trabalho que virou uma pessoa essencial na minha vida depois que nos encontramos num grupo de grávidas. Nossos filhos nasceram com três dias de diferença.
Mas nem todas as amizades são tão concretas assim. Teve algumas que nasceram porque eu adorava ler o que escreviam na internet (ainda adoro). Outras ainda são imaginárias – as autoras das newsletter e crônicas e livros, as apresentadoras de podcast. Aquelas que eu ouço e leio e tenho vontade de tomar um vinho, trocarmos histórias e gritar “eu tambéeeeeeem!”.
Ainda bem. Sem cada uma delas (real ou imaginária), não sei como teria passado por esta pandemia. Amo todas vocês.
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