Com as minhas três doses da vacina e a pandemia no que parece ser um momento mais controlado (o que quer que isso signifique), estou voltando a sair de casa. Voltando, no gerúndio mesmo. Como engravidei no finalzinho de 2020, passei 2021 todo entrincheirada em casa, apavorada com a Covid-19. Naquela fase em que todos começaram a sair, eu estava no terceiro trimestre. O medo de ir a um restaurante ou encontrar amigos me deixou entocada por muito, mas muito tempo.
Mas agora, aos poucos, começo a criar coragem para sair do casulo. Uma visita para uma amiga que também teve bebê aqui, um passeio no clube com as meninas acolá. O músculo do conforto aos poucos se exercita e fica mais firme. Quando vi, havia marcado almoço fora. Outra noite, saí para jantar com o Luiz pela primeira vez desde março do ano passado.
(Tudo meio cronometrado, é claro, pois as mamadas são uma realidade mais real do que todo o resto).
Na semana passada, fui a um encontro da minha turma do colegial e percebi que havia esquecido como se socializa. Não sei mais o tempo adequado para monopolizar a conversa, atrofiei a habilidade de falar e ouvir com calma – engulo cada história quem se perdeu no deserto e encontra, finalmente, um copo d’água gelado. Tropeço no diálogo, esqueço o que estava dizendo, me embanano nas milhares de perguntas que queria fazer. As minhas reações são exageradas, hiperbólicas – vontade de gritar, abraçar e papear por dias a fio.
Em alguns dias, tenho um casamento. Um casamento! Vou poder colocar salto alto, um brinco bonito, vestido – e vou dançar. Dançar! Quando achei que fosse dançar de novo? No começo da pandemia, ficou pronto o vídeo do casamento do meu irmão e quase não consegui olhar para toda aquela gente muvucando junto na pista. Tive certeza de que aquilo havia virado uma relíquia do passado.
A vida, no entanto, não quer nem saber do que a gente acha ou deixa de achar. Quando vi, chegou o convite e era hora de escolher o vestido.
A cada vez que saio da toca, descubro uma mudança na cidade. Uma loja nova, um bar que fiquei louca para conhecer. Outro dia, passei na frente do restaurante onde jantei pela primeira vez com o meu marido e descobri que ele havia fechado. Aquele lugar que era tão nosso, onde gostávamos de celebrar todos os aniversários de namoro. Foi lá, inclusive, a nossa última saída antes do início da pandemia – quando comemoramos 10 anos juntos.
Liguei na hora pra ele:
- Você não vai acreditar, amor. Fechou o Tappo.
- Como assim, fechou o Tappo? A gente pediu delivery de lá na semana passada!
- Pois é, fechou. Deve estar agora numa daquelas dark kitchens, sei lá. Tem um tapume na frente, uma placa dizendo que vai virar restaurante da rede daquele italiano famoso – lamentei.
- Pelo menos não virou loja de lâmpada, ele retrucou.
Todo mundo perdeu algo nesta pandemia – um parente, um amor, um emprego, a saúde mental. Uma amiga me disse que se você não surtou em algum momento, havia algo de errado. Algumas perdas são colossais, desmedidas na sua dor. Outras, são quase simbólicas – um lembrete de como a vida era antes de tudo isso começar.
Para estas pequenas, um alento: pelo menos não virou loja de lâmpada.
(Em tempo: depois descobrimos que o restaurante reabriu em outro lugar. E sempre: #usemascara #vacinassalvamvidas #forabolsonaro)
Como sempre uma delicia ler seus textos, parabéns! Eu sempre falo essa frase também: Todo mundo perdeu algo nesta pandemia – um parente, um amor, um emprego, a saúde mental.