Eu odeio oficinas de escrita. Não me entenda mal: eu adoro o conceito e sei como elas podem ajudar, mas passo sempre pela mesma jornada a cada vez que me inscrevo em uma que vai da empolgação ao pânico. Começo sempre animada, acreditando que daquela vez vai dar certo. Acho que é daquela vez que eu vou conseguir me dedicar e ter coragem de mandar um texto, que não vou me sentir péssima a cada feedback recebido nem me contorcer na hora de comentar os textos dos meus colegas. Oficina, não é você. O problema sou eu.
Ainda assim, continuo a me inscrever nelas. Há dois meses, um artigo que escrevi para o mestrado foi publicado em um journal americano e o meu coração deu três pulinhos instintivos em agradecimento a alguma promessa feita no meio do longo processo de revisão. Logo depois da publicação, recebi um email da minha orientadora dizendo que eu deveria me inscrever no workshop de escrita de não-ficção do programa de escrita criativa da universidade, irmão do meu Master of Liberal Arts.
Eu não tinha mais nenhuma desculpa para não aceitar. Não dava para deixar a síndrome da impostora no volante, a ocasião era boa demais. Ter três meses para a refinar a escrita dentro do mestrado, com todo o incentivo dado pelo programa, contando créditos? Parecia um sonho. Fora que o workshop era focado no gênero que mais gosto de escrever, o das memórias e ensaios pessoais. Aquele convite funcionou como um endosso, um selinho de credibilidade que eu poderia colocar no meu currículo interno: você dá conta. Sabe?
Fiz a matrícula. Gostei porque logo de cara tive uma aula de como enfrentar um workshop de escrita, com direito a diversas dicas. "Não espere elogios", "crie um ambiente seguro e confortável para todos", "encare cada comentário como uma oportunidade personalizada para melhorar o seu texto", "sua escrita vai crescer a cada feedback caprichado que der".
Na aula, nossa professora contou que o melhor editor com quem ela trabalhou nunca elogiou o texto dela. Nem uma vez. No começo doeu - ela esperava que ele fosse se derreter e dizer que aquele era O Melhor Artigo da História da Revista. Nunca aconteceu - mas o texto dela cresceu e amadureceu a cada leitura que ele fazia.
Este é o objetivo. Ler com carinho as histórias de cada uma (acredita que são só mulheres na turma?) e apontar o que funciona e o que pode melhorar no texto. E crescer desta forma ao longo dos meses como escritora.
Eu não seria doida de me voluntariar a ser a primeira a mandar o material para a turma, então tive pude estudar com calma o texto da minha colega e cada feedback que ela recebeu. Algo se amoleceu dentro de mim: eu vi o cuidado de cada uma e entendi o quanto aquele processo era importante. Entendi que estruturar os meus próprios pensamentos e opiniões sobre o material da minha colega me ajuda a encarar meus próprios textos com mais técnica e segurança.
Entreguei nesta semana o meu primeiro texto e vou passar a semana aguardando as cartas e revisões de todas elas. Mas, pela primeira vez, algo diferente aconteceu comigo na hora de compartilhar aquilo.
Pode ter sido pelo fato de que a ficção soa como uma flor de plástico na minha voz e que que a não-ficção é um lugar que ocupo com mais conforto. Ou então graças à análise criteriosa que fiz do texto da minha colega na semana passada. Ou então por toda a estrutura do curso, onde ficou muito claro o que é esperado de nós, como revisar um texto antes de entregá-lo, o que funciona bem na não-ficção, os exemplos maravilhosos de gente como Audre Lorde, W.G. Sebald e George Orwell.
Não sei. Mas senti que sabia o que estava fazendo e o que devia fazer. Entendi a mensagem de uma forma clara: usar toda a técnica disponível para contar uma história que só eu posso contar. Trabalhei durante duas semanas naquelas três mil palavras e ao final, ao apertar o botão Enviar, eu não estava morrendo de vergonha. Senti, claro, um nível apropriado dela, como acredito que qualquer escritor que se preste deve sentir. Veio também a sensação de vulnerabilidade que vem de expor o que tem de mais íntimo da forma mais literária que consigo. E se não for suficiente? E se não for interessante? Mas elas foram acompanhadas por uma empolgação. Cautelosa, mas feliz.
Que delícia ver a minha relação com a escrita se transformar assim.
Sabe, lendo seu texto percebi que jamais cogitei me inscrever em uma oficina de escrita ou coisa do gênero. Não sei se por "leoninismo" demais, segurança de menos ou, mais provável, um mix de ambos, essa ideia nunca passou pela minha mente. Refletindo em seus parágrafos, sinto que, pra mim, escrever é como respirar – simplesmente faço, nunca fui formalmente ensinada a fazê-lo, e entendo que por ser tão intuitivo vem um medo de que a banca me bloqueie de fazer desta maneira crua que me alimenta tanto!
Eu amo oficinas, adoro ver os processos alheios e ouvir feedbacks. Que bom que vc não correu dessa vez 🤸