Sempre amei histórias, mas quando era pequena, a minha favorita era de Rumpelstiltskin, o duende que ajuda uma moça com a ingrata missão de transformar palha em ouro. Era tudo culpa do pai dela, o moleiro da cidade que foi se gabar das teóricas habilidades da filha de fiar justo para o rei. Este fica tão alvoroçado que resolve, como todo rei que se preze, prendê-la em uma torre cheia de palha, bem dessas que pululam nos contos de fadas.
Caso não transformasse tudo aquilo em ouro, seria condenada à morte. A pobre moçoila obviamente não sabia nem por onde começar. No auge do desespero, aparece um duende. Ele promete ajudá-la em troca do seu colar. Dá certo. Na noite seguinte, o mesmo apuro, e ela dá a ele seu anel. Na terceira noite, sem mais nada para dar ao duende, ela promete a ele seu primeiro filho. Coisa de desespero mesmo.
Só que o rei fica tão impressionado com a moça e seus poderes mágicos que resolve se casar com ela – e ela, no maior estilo Síndrome-de-Estocolmo-dos-Irmãos-Grimm, topa na hora. Quando vem o primeiro filho, ela já sabe.
O Duende aparece e ela tenta, sem sucesso, trocar toda a fortuna de rainha pelo filho. A única alternativa proposta é adivinhar o nome do duende em, no máximo, três dias. Ela tenta, tenta, mas ele não tem nenhum nome popular. Na última noite, desesperada, sai andando pela floresta, até ouvir uma canção vinda de uma cabana. Era a casa do duende, onde ele cantava e se gabava do seu nome único: Rumpelstiltskin.
A partir daí, a história se resolvia rapidamente. O duende vai buscar o príncipe e a rainha diz a ele seu nome. Enraivecido, ele some do mapa e todos vivem felizes para sempre: o rei sequestrador, a rainha refém e o filho rifado (nota: os adjetivos só vieram muito tempo depois).
Fazia anos que não me lembrava deste conto de fadas, mas dei de cara com ele enquanto lia, na semana passada, o livro Pequenas resistências, de Rivka Galchen. A história de Rumpelstiltskin é citada pela autora como uma prova da dificuldade de escolher o nome de um filho:
Talvez nomear um recém-nascido não seja tão diferente de adivinhar o nome de Rumpelstichen: qualquer nome é possível, mas apenas um se mostra correto. É quase como se Rumpelstichen tentasse lembrar a filha do moleiro de que ela é sua mãe.
Tenho duas filhas e, nas duas vezes, houve algo de mágico na hora de escolher os nomes delas. Sei que tem um monte de casais que discute por meses até chegar a um consenso. Conheço a história de uma criança que ficou sem nome até os seis meses, inclusive. Até lá, era chamada de “bebê”.
Aqui em casa, foi completamente diferente.
Com a Bia, foi simples. Beatriz era o nome da minha boneca favorita. Amava o nome desde pequenininha e quando passou a fase das bonecas, resolvi que queria ter uma filha Beatriz. Faltava só combinar com o pai da criança – e encontrá-lo, no caso.
Conheci o Luiz, meu marido, algumas semanas antes de me mudar para Singapura. Estava indo a trabalho, sem data para voltar. Mas foi paixão, um incêndio mesmo, e quando chegou a data de partir, o namoro já era sério. Ele me levou ao aeroporto e, no carro, não sei direito o que deu em mim. De repente, sem muito aviso, soltei a história de sonhar com uma filha Beatriz. Quando percebi o que havia feito, estava roxa de vergonha. Era um amor novo, eu a caminho do outro lado do mundo com a passagem de volta aberta e falando de filhos. Louca.
Ele, no entanto, adorou o nome e disse que se tivéssemos uma menina, seria Beatriz. Note que ele disse “uma menina”, e não “você não prefere chamar um taxi?”. Deu certo. Fui e voltei de Singapura, nos casamos e quando soubemos que eu estava gravida de uma bebezinha, ela já tinha nome. Como eu disse: simples.
Na vez seguinte, foi completamente diferente. Estávamos ainda discutindo se iríamos criar coragem para tentar engravidar novamente. Havia toda uma carga, pois passamos anos tentando engravidar dela, sem sucesso, até que desistimos e coloquei um DIU. Aquela era a hora de ter bravura e encarar tudo aquilo de novo para ver se finalmente dava certo.
Ainda não havia plano concreto, nem nada. Um dia, eu estava meditando em casa com ele quando o nome me veio. Assim, do nada. Isadora. Gostei na hora, parecia uma homenagem para a minha avó Dora (eu contei a história dela na edição da semana passada, lembra?). Quando terminei a meditação, perguntei para o Luiz o que ele achava – achou lindo. Fomos ver o significado. Presente da deusa da fertilidade. Veio um temporal dentro de mim.
Houve ainda uma coincidência muito doida, pois quando fui tirar o DIU, a médica que fez a remoção se chamava... adivinhe: Dra. Isadora. Quase dei um grito de “você tá tirando com a minha cara”, mas consegui me controlar.
Ficou decidido, deste jeito que parece um impulso, mas, na verdade, é quase como ouvir o barulhinho do clique das peças se encaixando no lugar. Se conseguíssemos engravidar e se fosse uma menina, seria a Isadora. Quando soubemos que era uma menina, um olhou para a cara do outro, num reconhecimento: aquela bebê já tinha nome.
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Diz a minha avó que a pessoa faz o nome! Lindos nomes das suas meninas! ❤️
Lindas meninas e lindos nomes. Também adoro o nome Beatriz, é forte mas ao mesmo tempo é doce.
Eu tenho um Joaquim. Estava entre os nomes que o pai gostava e quando ele me disse as opções eu já passei a chamar o bebê de Joaquim, sem ao menos saber que esperava um menino.