Até te conhecer, achava que amor era ganhar presente no dia dos namorados. Algém que me buscasse em casa e ligasse sempre no dia seguinte. Flores para as datas especiais e um anel no dia do pedido.
Mas você entrou na minha vida, o tempo passou e aprendi a reconhecer o amor escondido que perfuma o dia a dia. É o levantar para pegar só mais um dedinho do Negroni que está na geladeira enquanto fico na mesa, vendo stories e compartilhando bobagens com você. Passear no shopping e comprar a sua barra de chocolate preferida - nada daquelas caixas de bombons. Quando você se levanta na madrugada para cuidar da nossa filha que acordou e me deixa dormir direto. Ou sai da cama mais cedo no sábado e fecha a porta para evitar todos os barulhos e invasões caninas - só para me dar um tempinho a mais de sono. Amar é aceitar a cachorrinha que não queria - e aprender a amá-la. Fazer a receita favorita de ovo mexido toda manhã, mesmo com sono, cansaço, pressa. Levar na escola. Dividir o último pedaço. Dormir toda noite de conchinha, mesmo depois de tantos anos.
Amor não é estapafúrdio e declamatório - é quieto e constante. É na rotina que a gente o encontra. Se for esperar a data comemorativa, esquece. Ele é capaz de se perder no caminho e encontrar outras paixões.
A bell hooks1 diz que amor é uma ação, e não um sentimento - e que amar é cuidar do outro e de nós mesmos. Regar e regar, mesmo na colheita. Não tem verão, primavera, inverno ou outono. Precisa cuidar no dia a dia - foi o que o pai de uma amiga me ensinou quando eu era menina e cuidava de um coração partido após a separação dos meus pais.
Mas ainda assim, achava que o aniversário de casamento importasse. Que a gente precisava comemorar com vinho e lingerie nova. Foi você que me ensinou, no entanto, que é muito mais sexy lavar a louça todo dia. Ainda adoro as flores, os gestos, as datas especiais - mas entendi que o amor é muito maior do que elas.
Amor é falar com carinho no telefone, mesmo com tanta urgência, pressões e falta de tempo. É o apelido bobo que ainda impera, muito tempo depois de a paixão inicial acalmar. É um dicionário particular que se renova a cada dia, com um estoque infindável de piadas internas. É pagar o IPVA sem o outro precisar lembrar. É olhar para você e saber que está na hora de ir para casa - mesmo que eu ainda queira uma saideira. Inventar formas de carinho que não estão em nenhuma lista na internet.
É ficarmos irritados com o jeito de cada um de educar, discordar das prioridades, estressar com as manias que cismam em piorar ao longo dos anos - e ainda assim encontrar um jeito de não conseguir adormecer sem encostar o meu pé no seu.
A paixão às vezes diminui e depois aumenta, mas o amor, meu amor, parece que só cresce. (Já te disse que te amo hoje?)
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Esta carta fez-me recordar por que é que amo tanto o meu namorado. Amor é dia-a-dia, não é dia-de-festa. Amor é pijama e roupão, não é glitter e salto alto. Amor é arroz na panela, sopa ao lume, bife na chapa, não é amostra gourmet para foto de Instagram. Amor é apanhar os cabelos que ficam largados na pia, não é full-face de make até ficar parecendo uma boneca de Anime. Amor é real, constante, estrada com buracos e valas e alcatrão já gasto. Não tem de ser festa de reveillon, avião decolando na pista, viagem interespacial a Marte. O amor vive das coisas simples... e talvez por isso seja tão complexo. (Amei tudo na tua carta!)
amar e se relacionar são encontros e desencontros, né?
quando dá certo e andam juntos, é bom demais. <3