Passei as férias sem Instagram. Foi daquelas decisões que precisaram de um empurrão para se tornarem óbvias. Estava há tempos cansada da rede social, mas achava que seria impossível ficar de fora. Como iria divulgar minha newsletter sem ela? Como me informar sobre os assuntos do meu interesse? Como acompanhar a vida dos outros?
Só que em meados de dezembro, minha conta foi invadida. Eu não tinha ideia de como me sentiria vulnerável e exposta. Perdi o sono ao constatar que havia um alguém malicioso vendo minhas fotos e DMs e usando minha conta para tentar passar golpe nas pessoas que me seguem. No dia seguinte, consegui recuperar a conta - só para mudar o nome, arquivar fotos pessoais e apagar o app do meu celular.
Foram mais de 30 dias sem ver quem foi viajar, nem os destinos mais badalados do meu feed. Fiquei de fora das fofocas de gente conhecida e desconhecida, sem saber quem pegou quem e quem brigou com quem. Não vi as listas de livros, filmes, séries, bandas, shows, restaurantes e quetais preferidos do ano. Perdi as fotos de família, todos lindos e iluminados de branco. Os votos coletivos por uma no mais leve, com mais esperança saúde alegria e paz tampouco chegaram a mim. Soube do ataque a Brasília como faziam os antigos maias e astecas: pela home do UOL. Fui poupada da onda de notas de repúdio privadas. Não sei mais quais são o meme ou a dancinhada vez.
Mas vi muitas outras coisas. Vi uma família de quero-queros que fez um ninho na praia. Acompanhei diariamente o pai que buscava alimentos e a mãe que não levantava de forma alguma do que parecia ser um eterno chocar de ovos. Um passarinho saiu deles, e depois mais um. Aprenderam a andar e a buscar comida sob os olhares atentos dos pais. Passei nervoso quando um lagarto enorme tentou chegar perto dos filhotes, e só acalmei quando consegui contar a família completa passeando por um gramado horas depois.
Tive tempo para testemunhar o crescimento daquela família e criar uma história completa sobre ela. Era uma família nuclear de papai-mamãe-filhinho-e-filhinha quero-quero, a versão margarina das aves. Papai e mamãe se amavam muito e estavam felizes e nervosos com a chegada da prole. Eram os primeiros filhos do casal e, se pudessem, vestiriam um macacão azul no menino e um rosa na menina. Não queriam visitas na maternidade - e ai das crianças e curiosos que tentassem chegar perto demais dos bebês. Não sei se você sabe, mas quero-quero ataca pra valer. Eram o retrato da felicidade e caos da maternidade.
Se estivesse com o Instagram no celular, tenho certeza que teria ficado com a cara na tela e perdido aquilo tudo. Sem o aplicativo, a verdade era que muitas vezes esquecia o aparelho em casa e descia para a praia só com protetor solar, meu chapeu, os baldinhos e pazinhas e um livro.
Ah, os livros. Li um volume inacreditável deles nos meus dias de descanso - e não precisei contar a ninguém. Brinquei com as meninas, mergulhei no mar, joguei UNO. As poucas fotos que tirei ficaram para o prazer de rechear o meu álbum de férias e compartilhar com os avós no WhatsApp.
Como você pode ver, não perdi muito, mas ganhei paz de espírito e presença (ô palavrinha clichê). Meu tempo de tela despencou, minha qualidade de vida aumentou. A sensação foi de aprender que existe um caminho para atravessar o momento em que acordo até aquele em que fecho novamente os olhos sem passar tanto nervoso, sem me comparar aos outros e sem achar que estou permanentemente atrasada numa corrida insana sem linha de chegada.
Mas as férias sempre acabam. Não é factível para mim ficar de fora do Instagram - lá acompanho o trabalho de pessoas que me interessam, fico sabendo de livros e da vida das pessoas que amo. Mas quero uma outra relação com o aplicativo. Quero que ele seja um lugar para postar sobre literatura e esta newsletter, mas sem tanta pressão interna. Minha vida pessoal pode ficar de fora. Até mudei o nome - virou @voutefalar_news. Coloquei um limite de tempo de uso diário. Removi da primeira tela e retirei as notificações. Não sei se isso ajuda muito. Se você descobrir uma forma mais saudável de lidar com ele, me avisa?
Me identifico super. Já tem uns meses que não olho stories, que antes me causavam certo mal estar de FOMO ou comparações com as vidas (e jamais com os problemas) das outras pessoas. Hoje olho 1x por dia um pouco do feed, mas sinto que realmente me desapeguei do app (não das pessoas). Não que isso traga algum tipo de superioridade, como pode parecer, mas venho percebendo o quanto é cansativo sustentar essa roda de valorização dos momentos alheios e tb até que ponto a vida social ficou meio limitada àquele espacinho. O insta é uma forma de otimizar o tempo dedicado às pessoas, tipo likes pra lembrar os outros de que existimos ou para se relacionar com a maior quantidade de gente. Acho que divaguei kkkk
Beijos ♥️
Eu tenho esse costume de desligar as redes por pelo menos 15 dias já tem uns 5 anos. Mas sinceramente, tenho sentido que isso não está me bastando. Eu volto e depois de um tempo sou sugada de novo porque em parte não é algo que basta força de vontade. É basicamente a gente lutando contra um exército de neurocientistas, especialistas em comportamento humano, publicitários, marqueteiros e programadores que desenham a ferramenta pra nos fazer sentir - falta, inveja, ansiedade, curiosidade, raiva. Enfim, é pelo sentir que a gente se mantém ali. Eu sempre achei que era importante estar nas redes não só pra mostrar o que faço - esse é hoje o meu trabalho remunerado -, mas pq estar lá com uma proposta diferente de uso é parte do "outro mundo é possível" que eu tento desenhar. Mas não sei, tenho pensado cada vez mais em radicalizar meu uso porque está me afetando de um jeito que não quero mais. Tem sido dias difíceis pensando sobre isso.