Antes da crônica da semana, um monte de avisos para vocês:
Vou para a Flip nesta quinta-feira e vou fazer uma cobertura no meu Instagram. Me segue por lá para acompanhar tudo - e se você for para Paraty, não deixa de me avisar!
O primeiro encontro do clube do livro foi um sucesso e já definimos qual será o próximo livro: Humanos exemplares, de Juliana Cunha. O encontro será no dia 19 de dezembro, às 20h. Vem ler com a gente? (Para se inscrever, basta atualizar a sua assinatura para a versão paga da newsletter.)
Outro dia, no meio de uma sessão de biblioterapia1, uma pessoa desabafou comigo que não via sentido em ler literatura. “Não serve para nada!”, ela exclamou. Aquilo que ela via como um problema, eu encaro como uma vantagem. Olha só que maravilha: a ficção não serve para nada!
A sensação que tenho hoje é que tudo precisa servir para algum propósito. A comida deve emagrecer, a meditação só para melhorar o foco e a concentração, as oito horas de sono diárias devem garantir a performance e os livros, coitados, precisam também entrar na dança. Se for um livro para aprender algo ou conquistar um novo hábito, está valendo. Agora literatura? Ela não vai contribuir com nada para a otimização da vida, trabalho, estudos ou o que quer que seja.
Mas é aí que mora o valor dela. Depois que li A sociedade do cansaço, do filósofo coreano Byung-Chul Han, entendi que não temos anticorpos para dizer não para os excessos que nos rodeiam: de trabalho, da “superprodução e do superdesempenho”, como diz o autor. Não é à toa que vivemos todos cansados, à beira do burnout (ou já no meio dele). Tudo que fazemos hoje deve contribuir para nossa produtividade e longevidade. “Trabalhe enquanto eles dormem”, não é assim que se fala?
Nas livrarias, as sessões de autoconhecimento, autoajuda e autodesenvolvimento não param de crescer. Mas e a ficção? Qual é o espaço dela neste cenário que parece tão distópico?
Para mim, a literatura é o lugar de resistência desta mentalidade. Ler algo por prazer: quem poderia imaginar que isto seria revolucionário? Ao ler um romance, você não quer aprender nada. Não está atrás de um hack de produtividade, nem em busca de um mindset novo. Quer apenas mergulhar na história, se apaixonar pelo personagem, viver uma realidade ou perspectiva diferente, sentir a pele do outro. Nada que garanta uma promoção ou aumento no final do ano.
Este é um espaço onde não há cobrança (a menos que você entre na competição de quem-lê-mais no Instagram). No qual você pode desligar a pressão constante de fazer mais e viver o presente, uma página depois da outra. É terapêutico mesmo.
Mas não é só isso. Na hora em que desliga do mundo de fora e vai para dentro do livro, você ganha tanto. A literatura revigora nosso próprio potencial criativo e nos mostra que a mudança é possível. A mudança, aliás, é o grande motor das boas obras de ficção. Se até um personagem chatonildo como o Andrey, de Guerra e paz, consegue se tornar um herói, quem somos nós para não tentar? A ficção nos ajuda a entender as escolhas dos outros e nos permite habitar a consciência deles por alguns instantes. O resultado? Nos sentimos menos sozinhos e estranhos.
“Ah, mas nada daquilo é verdade!”, alguém pode reclamar. Eu retruco: não precisa ser verdade para ser universal. A regra básica da literatura é que as ações dos personagens devem fazer sentido, precisam obedecer a uma lógica. Mesmo em mundos ou futuros diferentes, as ações dos personagens não podem parecer algo fora do caráter deles. Ao acompanharmos suas vidas e decisões, ganhamos empatia por eles e temos a possibilidade única de viver vidas inteiras durante aquela leitura.
A literatura não serve para nada – e ainda assim, ela traz mais presentes do que a nossa subjetividade consegue contar. E o fato de não ter propósito algum é, na verdade, um tesouro disfarçado.
Você sabia que eu sou biblioterapeuta na The School of Life? Vem saber mais e agendar uma sessão comigo aqui.
A literatura não serve pra nada, mas serve pra tudo <3
Concordo bastante, mas acho também que a literatura nos ensina tanto, enfim.... cansada também dessa sociedade extremamente produtiva em que descansar é pecado. Btw, eu fiz uma sessão de biblioterapia na School of Lige em 2020, pena que não era você. 💔